Sociedade Canina

Dependência do animal de estimação pode ser sintoma de doença

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Foto: Juliana Barbosa
Por Samira Hidalgo

Vera Socci, formada em psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) há 30 anos, afirma que nutrir dependência pelo animal de estimação pode ser sintoma de doença.

Sociedade Alternativa: Qual o perfil das pessoas sujeitas a desenvolverem essa dependência pelo animal?


Vera Socci: Depende de como definirmos dependência. Essa dependência é não poder viver sem, adoecer sem o animal. Talvez exista algo mais complicado na vida dessa pessoa que a faz apresentar os sintomas de vinculação exagerada com o animal. Por exemplo, uma criança que se sinta muito rejeitada, comparada, auto conceito baixo, pode se prender a alguma coisa que a valoriza, como o animal. Mas essa dependência não é a doença em si, mas sim o sintoma de alguma coisa que está por trás.

S.A.: Atualmente existem pessoas que recolhem muitos animais abandonados das ruas e o levam para casa, mesmo que o lugar não seja apropriado para abrigar tantos cães. Isso também pode ser diagnosticado como doença?


V.S.: Eu não acho que isso seja doença. Às vezes a pessoa precisa de uma função importante, precisa ser valorizada, e o animal de estimação a valoriza. Então ela se sente importante por estar cuidando de animais abandonados. Isso é muito freqüente, mais do que a gente imagina. Não se trata de cuidar para que a pessoa deixe de ter esse comportamento, mas é necessário ver o que há por trás, o que acontece na vida daquela pessoa que a leva a agir dessa maneira, e não fazer com que ela pare de fazer algo benéfico pra ela e para os animais.

S.A.: Uma pessoa que maltrata animais pode ter distúrbios psicológicos? Quais seriam os motivos para que alguém desenvolvesse raiva de um cachorro ou qualquer outro animal?

V.S.: A questão do mau trato é complicada. Porque de fato uma pessoa extremamente agressiva, hostil, enraivecida, ela pode ter uma reação com animais, mas é da mesma forma com que ela vê gente. Uma pessoa dócil, meiga e afetiva não vai ser hostil com um animal. Para a pessoa ser agressiva com o animal, ela tem isso como desenvolvimento de personalidade dela. Então não é específico com o animal, mas sim um sintoma de alguma coisa maior, mais profunda, na personalidade da pessoa.

S.A.: Essa relação entre cães e seres humanos como um laço familiar é algo normal/saudável tanto para a pessoa quanto para o animal?

V.S.: Todos os vínculos são importantes. As pessoas que criam animais de estimação, sofrem quando o animal adoece, quando morre, então é vinculação. Vinculação é sempre positiva. A gente não pode querer transformar o animal em humano. Assim como não podemos transformar a personalidade do filho na nossa personalidade. Temos que respeitar os animais. Então um cachorro não pode ser tratado como gente, porque ele é muito mais feliz como cachorro. Quem realmente ama respeita a individualidade do amado.

S.A.: O animal também pode sofrer de algum problema psicológico?

V.S.: Enquanto tudo do animal é suprido, tendo alguém para alimentar, dar banho, brincar. A hora que faltar isso, é como uma criança mimada, quando falta a pessoa geralmente deprime, se revolta. O cão pode ter uma reação às perdas das regalias que ele tinha. É como ter tudo e de repente não ter nada. 

S.A.: Os cachorros hoje têm condições de viver por conta própria, ou se tornaram totalmente dependentes dos seres humanos?

V.S.: O que a gente percebe pela observação de animais criados no campo, na zona rural, é que vivem sozinhos. Eles caçam, se viram. E sobrevivem,chegam até a velhice. A possibilidade de desenvolvido eles têm. Agora, quanto mais pura uma raça, menos resistência desenvolve. Pastor alemão, um Golden, essas que são raças muito depuradas, se não tiver tratamento humano, ele adoece. Porque tudo nele é frágil, porque as raças são muito mexidas. Quanto mais vira-lata maior a sobrevivência. Quanto mais pura, menor sobrevivência. O cachorro na situação natural sobrevive melhor do que nessa situação de dependência do homem.

S.A.: A maioria das pessoas que tratam seus cães como “pessoas” afirmam que é mais fácil lidar com animais do que com pessoas. Isso pode ser reflexo de algum tipo de trauma sofrido pela pessoa?

V.S.: Falta alguma coisa no desenvolvimento dessa pessoa. Quando é mais fácil lidar com o animal, é porque a reação do animal é muito melhor controlada do que a reação humana. Isso não é trauma, mas sim uma falha no desenvolvimento social da pessoa.


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