Sociedade Canina

Crônicas

Luz do sol

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Foto por Juliana Barbosa
Por Samira Hidalgo

Mais uma vez está chovendo na minha cidade natal, Mogi das Cruzes. O tempo está frio e o dia cinzento. Vaga sozinha pelas ruas do centro da cidade. As pessoas têm pressa, muitas não me vêem e tropeçam em mim. Nessa hora eu me encolho preparada para ouvir um: “Sai pra lá, cachorro!”.


Já me acostumei a esse tratamento. Meu antigo dono me tratava ainda pior, me deixava passando fome e sede. Mas o que eu sentia mais era falta de amor. Aquele sentimento que eu via, por trás das grades do portão enferrujado, passar do amigo fiel para com seu dono, e vice-versa.

Depois de um tempo eu vim parar aqui, na rua. Parece que tentar me distrair mordendo o sapato do filho do meu dono não foi uma boa ideia. Tentei voltar pra casa, mas meu faro não ajudou muito.

Faz seis meses que sobrevivo dos restos de comida jogados no lixo. Da caridade de algumas pessoas, que vendo minha magreza excessiva me dão pão ou compram uma coxinha na pastelaria da esquina. Às vezes, os rapazes do açougue também são legais e me dão alguns ossos pra roer.

Com apenas dois anos de idade, posso dizer que já passei por poucas e boas nesta vida. Muitos amigos que consegui andando por aí acabaram morrendo por doenças ou atropelamento. Alguns foram capturados pela famosa carrocinha, mas devem estar melhor do que eu aqui.

A chuva parou, vou sair do meu esconderijo para ver se acho alguma alma gentil, que possa me dar algo para comer. Meu estômago vazio está me matando! E essas pulgas? Essas pulgas hão de me deixar louca um dia!

Ei! Ei! Espera aí pra onde você está me levando? Puxa, sua voz parece a de um anjo. Eu morri!? Tudo bem, eu vou com você, mas pra onde vamos?

O anjo me deu um banho, tirou minhas pulgas. Mal posso acreditar, ela está trazendo uma tigela imensa com ração, ai que delícia! Muitas pessoas estão me olhando agora, parece até que me analisam.

Moleque, me solta! Me solta! Como é? Você vai me adotar? Não brinca assim comigo que é pecado, viu?!

Estou no meu novo lar, em uma cama de cachorro quentinha. Comi tanto que até deixei um pouco de ração na tigela. Agora o tempo está abafado, mas não tem problema, minha água está fresquinha e limpa. Opa! Meu dono está me chamando pra brincar. Adoro quando ele joga a bolinha de tênis pra eu pegar! Vou lá! A propósito, meu nome é Sol, porque, desde que cheguei à minha nova casa, o sol não deixou de aparecer por aqui, nem mesmo nos dias nublados. Dizem que por onde passo eu trago a luz da felicidade. Isso é tão legal!

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